Lembro como se fosse ontem. A casa quase caindo aos pedaços. O cheiro das dificuldades econômicas e a marca da solidão. Pernas paralizadas. O olhar coberto de dor e as rugas reveladoras não apenas da passagem do tempo mas, tambem, do mal trato da vida. D. Júlia vivia só, naquele molambo de casa. Só parecia sorrir quando cantávamos para ela músicas que falavam de Jesus.
Que alma era aquela, meu Deus? Eu me perguntava desse jeito pois me intrigava a solidez de sua resignação. Sem estudo,como milhares de Júlia espalhadas por este país. Ao mesmo tempo, me encantava a robustez espiritual que apresentava. Certa feita me revelou que sentia "bichos" que andavam na sua pele. Nunca os vi. O quarto escuro e sem luz eletrica dificultava. As vezes ela movimentava os dedos como se estivesse tentando pegar os bichos que a incomodavam. Nenhuma queixa porem. Nenhum gesto de revolta contra a vida. Parece que era visitada por um filho que tinha problemas de alcoolismo. D. Júlia foi uma grande lição de vida para mim. Isto ocorreu há cerca de15 anos atrás.Não sei porque hoje me recordei mais fortemente dela. Será alguma data especial dela ou sua visita ao rapaz que estreitara contatos com sua mazela?
Deus nos ensina através dessas vidas, ignoradas pelo mundo mas tão caras para o Universo.
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